José Mário Branco, Fausto - Canto dos Torna Viagem letra (lyrics)
[José Mário Branco, Fausto - Canto dos Torna Viagem letra lyrics]
Já sem armas nem bagagem
Nem os brazões da equipagem foi ao voltar
Pátria moratória no coração da história
Que consumiste a glória num jantar
Foi como se Portugal
P'ra seu bem e p'ra seu mal
Andasse em busca dum final p'ra começar
Ávida violência reverso da inocência
Sal da inconsciência que há no mar
Império tão pequenino de portulano caprino
Bolsos de sina e de sino em cada mão
Pátria imaginária de concistência vária
Afirmação diária do teu não
As malas dos portugueses
São como os olhos das rezes
Que se mastigam três vezes em cada chão
Cândida ignorância grande desimportância
Os frutos da errância já lá vão
Ai Senhora dos Navegantes me valei
De África, do sal e do mar só eu sobrei
Foi p'ra me encontrar que amanhã já me perdi
Longe vai o tempo em que eu já não estou aqui
Ai Senhora dos Talvez-Muitos-Mais-Sinais
Socorrei estes desperdícios coloniais
Foi na noite fria que o dia me cegou
Inda agora fui, inda agora cá não estou
Ai Senhora dos Esquecidos me lembrai
O caminho que p'ra lá vem e p'ra cá vai
Etecetera e tal, portugal é nós no mar
Inda agora vim e estou longe de chegar
Ai Senhora dos Meus Iguais que eu subtraí
Foi pataca a mim e não foi pataca a ti
Se é tão grande a alma na palma do meu ser
Algum dia eu vou finalmente acontecer
Porque não tentar outro ponto de vista
A história dos outros quem a contará
Se qualquer colónia sem colonialista
São os que já estavam lá
Tentemos então ver a coisa ao contrário
Do ponto de vista de quem não chegou
Pois se eu fosse um preto chamado Zé Mário
Eu não era quem eu sou
Os navegadores chegaram cá a casa
E foi tudo novo p'ra eles e p'ra mim
A cruz e a espada e os olhos em brasa
Porque me trataste assim?
Não é culpa nossa se quem p'ra cá veio
Não se incomodou ao saber do horror
A história não olha a quem fica no meio
E o que foi é de quem fôr